Etimologia gr. théatron,ou 'lugar onde se assiste a um espetáculo, espectadores, o próprio espetáculo' (< gr. théa 'espetáculo, vista, visão' + o suf. -tron 'instrumento', donde, lit., 'máquina de espetáculo'), pelo lat. theátrum,i 'teatro, lugar para jogos públicos, reunião de espectadores ou ouvintes, ajuntamentos, assembléia, auditório'; ver teatr(o)-; f.hist. sXV theatros, 1836 teatro.
Dicionário elect. Houaiss
Hoje, dia Mundial do Teatro, não podemos deixar de relembrar, Pessoa enquanto “poeta dramático escrevendo em poesia lírica” (cf. Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação).
Apresentamos aqui um excerto de O Marinheiro, drama publicado no número 1 de Orpheu (1915).
Segundo os estudiosos, esta obra constitui um marco indelével na evolução literária do seu autor. Para Teresa Rita Lopes, existem laços indissociáveis entre O Marinheiro e a vida do próprio Pessoa. Náufrago da sua infância, afastado dos amigos, do seu espaço natal, desde muito cedo “pôs-se a sonhar” não apenas uma outra pátria, “uma nova terra natal” mas também “os companheiros da infância e depois os amigos e os inimigos da sua idade viril”. Segundo Bréchon e Seabra Pereira, O Marinheiro anuncia o aparecimento nele de “vozes” novas, podendo ser lido como uma alegoria da criação literária e, ainda, como um primeiro ensaio da aventura heteronímica.
O MARINHEIRO
DRAMA ESTÁTICO EM UM QUADRO
A Carlos Franco
Um quarto que é sem dúvida num castelo antigo. Do quarto vê-se que é circular. Ao centro ergue-se, sobre uma essa, um caixão com uma donzela, de branco. Quatro tochas aos cantos. À direita, quase em frente a quem imagina o quarto, há uma única janela, alta e estreita, dando para onde só se vê, entre dois montes longínquos, um pequeno espaço de mar.
Do lado da janela velam três donzelas. A primeira está sentada em frente à janela, de costas contra a tocha de cima da direita. As outras duas estão sentadas uma de cada lado da janela.
É noite e há como que um resto vago de luar.
PRIMEIRA VELADORA — Ainda não deu hora nenhuma.
SEGUNDA — Não se pode ouvir. Não há relógio aqui perto. Dentro em pouco deve ser dia.
TERCEIRA — Não: o horizonte é negro.
PRIMEIRA — Não desejais, minha irmã, que nos entretenhamos contando o que fomos? É belo e é sempre falso. ..
SEGUNDA — Não, não falemos nisso. De resto, fomos nós alguma cousa?
PRIMEIRA — Talvez. Eu não sei. Mas, ainda assim, sempre é belo falar do passado... As horas têm caído e nós temos guardado silêncio. Por mim, tenho estado a olhar para a chama daquela vela. Às vezes treme, outras torna-se mais amarela, outras vezes empalidece. Eu não sei por que é que isso se dá. Mas sabemos nós, minhas irmãs, por que se dá qualquer cousa?...
(uma pausa)
A MESMA — Falar do passado — isso deve ser belo, porque é inútil e faz tanta pena...
SEGUNDA — Falemos, se quiserdes, de um passado que não tivéssemos tido.
TERCEIRA — Não. Talvez o tivéssemos tido…
PRIMEIRA — Não dizeis senão palavras. E tão triste falar! É um modo tão falso de nos esquecermos! ... Se passeássemos?...
TERCEIRA — Onde?
PRIMEIRA — Aqui, de um lado para o outro. As vezes isso vai buscar sonhos.
TERCEIRA — De quê?
PRIMEIRA — Não sei . Porque o havia eu de saber?
(...)
1913
Poemas Dramáticos . Fernando Pessoa. (Notas explicativas e notas de Eduardo Freitas da Costa). Lisboa: Ática, 1952
1ª publ. in Orpheu , nº1. Lisboa: Jan-Mar. 1915.
In http://arquivopessoa.net/textos/1973.
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